Produtividade tóxica: até onde essa corrida faz sentido?

Contratar líderes exige mais que analisar currículos: comportamento e inteligência emocional definem o sucesso na alta gestão.
Headhunter e Sócia da Avante Consulting desde 2014, ja conduziu mais de 500 processos de consultoria C- Level, Middle e Top Management, hoje também orienta executivos que buscam crescer com mais clareza e estratégia.
14 de Agosto de 2025
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O currículo brilha: MBA fora do país, certificações robustas, entregas relevantes, fluência em três idiomas. Na teoria, o profissional ideal.
Mas na prática, mais uma liderança que não se sustenta. Essa cena se repete com frequência nos bastidores da alta gestão. Empresas contratam executivos impecáveis no papel, mas que, poucos meses depois, se mostram desalinhados com o que o cargo realmente exige, não do ponto de vista técnico, mas comportamental.
Recentemente, acompanhei o caso de um Diretor de Tecnologia contratado para liderar a transformação digital de uma empresa tradicional. Era um movimento estratégico, aguardado com expectativa. O nome escolhido vinha de uma big tech, com cases de sucesso, forte reputação no mercado.
As entrevistas foram sólidas, conduzidas com segurança e objetividade. Mas, nas primeiras semanas após sua entrada, começaram os sinais e não eram técnicos. As decisões passavam a ser tomadas de forma isolada, sem alinhamento com os demais times. Reuniões se tornavam tensas. Faltava escuta. Sob pressão, ele se fechava ainda mais. Em vez de construir alianças internas, gerava resistência. A cultura da empresa — mais colaborativa, menos hierárquica — parecia incomodá-lo. O time se afastou. A confiança se perdeu.
Em menos de um ano, a cadeira foi aberta novamente. Esse é o tipo de caso que me faz voltar sempre à mesma pergunta: por que seguimos contratando pelo que está no papel, e demitindo pelo que aparece só depois?
Ainda priorizamos a trajetória acadêmica, os cargos anteriores, os projetos entregues, como se isso bastasse para prever o impacto real de uma liderança. Mas o que sustenta alguém em um cargo de alta responsabilidade não é apenas o que ela sabe — é como ela age quando
está sob pressão, como reage diante do que não controla, como se posiciona num ambiente em transformação, como influencia quando ainda não tem protagonismo, como lida com o contraditório sem recorrer à defensiva.
Essas nuances, que aparecem nas entrelinhas, são o que determinam a solidez de uma liderança. E, ainda assim, são negligenciadas com frequência assustadora nos processos seletivos.
A boa contratação não é aquela que busca alguém pronto. É aquela que entende, com profundidade, o que aquele contexto pede — e quem tem repertório, sensibilidade e inteligência emocional para ocupar aquele espaço com maturidade. Nem sempre o melhor currículo entrega isso. E nem sempre quem brilha na entrevista consegue sustentar o brilho na rotina, nas conversas difíceis, nos embates naturais de quem ocupa uma
posição de influência.
No fundo, não estamos falando de técnica, e sim de comportamento. Não é sobre o que a pessoa fez, mas sobre como ela faz. E se não trouxermos essa camada para o centro da decisão, vamos continuar apostando alto. Para demitir cedo.
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