Futuro do trabalho com IA: e se o maior risco for humano?

Ferramenta trouxe ganho de 25% no tempo médio de contratação; atualmente, 64 cargos da empresa usam a IA no processo de recrutamento
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30 de Junho de 2025
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A gigante do setor alimentício BRF faz mais de 30 mil contratações no mundo a cada ano, enquanto as inscrições e currículos no banco de talentos chegam a bater os 3 milhões.
Diante desse volume, havia a preocupação da BRF no Brasil com o seu tempo médio de contratação (SLA) e com a experiência tanto dos recrutadores quanto dos candidatos. Em vagas mais concorridas, estes se frustravam com um tempo maior de espera por uma resposta, ao passo que os recrutadores da companhia perdiam em eficiência e assertividade.
Para sanar o problema, a BRF decidiu aplicar sua jornada de transformação digital nos processos de recrutamento e buscar por soluções com inteligência artificial (IA).
“Testamos algumas ferramentas existentes no mercado, mas nenhuma delas nos trouxe o ganho prometido e esperado”, explica Cristiane Costa, gerente executiva de atração, seleção e diversidade da BRF.
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A BRF optou, então, por desenvolver dentro de casa uma ferramenta customizada de IA que facilitaria o processo de triagem e ajudaria os recrutadores a montarem com mais rapidez uma shortlist de candidatos a serem entrevistados.
No início de 2024, a área de atração e seleção contou com os times de ciências de dados e aceleração digital para desenvolver a solução para atender às necessidades de recrutamento da BRF.
O resultado foi o recrutamento automatizado apelidado de ExperiêncIA. Utilizando os sistemas de machine learning e inteligência artificial para buscar e analisar currículos automaticamente, a companhia consegue fazer a triagem dos currículos que se encaixam na descrição da vaga.
Ao analisar os currículos (é preciso apenas quatro segundos para cada um), a IA cria um mapa de palavras, posteriormente dando notas a cada um e criando um ranking. Ao ler o texto do currículo, ela consegue entender quais estão mais de acordo com a descrição da vaga e também analisa o tempo de experiência do candidato.
“Nessa triagem, não importa a universidade da pessoa ou qualquer dado demográfico. O que conta é a experiência da pessoa e o encaixe com a descrição da vaga”, diz Cristiane. “Em um mundo em que a tecnologia faz a primeira etapa do processo seletivo, é necessário cada vez mais que os candidatos leiam atentamente a descrição da vaga, garantam que tenham a ver com ela e escrevam bem seus currículos”, completa.
A ideia inicial era aplicar a nova ferramenta para seleção de operador de produção, cargo com alta volumetria e o que mais contrata na companhia. No entanto, essa posição de entrada exige poucos pré-requisitos e muitos candidatos não possuem currículos, o que gerou falta de dados para análise pela IA, inviabilizando o projeto.
Assim, a BRF optou em abril de 2024 por usar o ExperiêncIA para dois cargos da área comercial, de promotor e de vendedor. São cargos que também têm alto volume de inscrições e contam com mais requisitos e experiência mínima.
Nos testes iniciais, a companhia acompanhou de perto todo o processo para descobrir falhas nas análises da IA e promover os ajustes. Um time de recrutadores validava o ranking criado pela IA, checava se não havia nenhuma anormalidade e garantia que a nota criada fazia sentido para aquela pessoa e vaga. Qualquer “alucinação” da IA era relatada aos cientistas de dados.
Os recrutadores calibraram questões subjetivas que a IA precisou aprender, como, por exemplo, não dar uma nota alta para um candidato com perfil de gerente de vendas e alto tempo no mercado, sendo que ele concorria a uma posição de entrada. Nesse caso, era preciso que alguém em início de carreira e com o perfil do nível da vaga obtivesse a maior nota.
Após quase um ano de uso, os avanços nos dois cargos que estrearam o programa, de promotor e de vendedor, mostraram a eficácia do projeto: ganho de 25% no SLA, melhorando em quatro dias o tempo total para a contratação, entre o dia da abertura da vaga e o primeiro dia de trabalho da pessoa.
Como a análise acontece imediatamente após o currículo chegar, não é preciso passar o período de oito dias de inscrições para iniciar os trabalhos. Poucos segundos após o término dessa etapa, o recrutador já tem uma shortlist pronta na mão.
Os recrutadores também relataram à área de atração e seleção que a ferramenta facilitou chegar nos nomes a serem entrevistados, trazendo um resultado mais assertivo ao gestor que necessitava da contratação.
“Esse ganho é crucial em um segmento altamente competitivo, onde nossos concorrentes também querem contratar essas pessoas. A BRF precisa garantir que será mais rápida na atração dos talentos. Após a implementação da IA, tivemos muitos casos de pessoas que nos falaram: no dia em que comecei aqui, a outra empresa me chamou para a entrevista”, relata Cristiane.
Em 2025, 64 cargos da empresa já usam a IA para o recrutamento.
Para 2025 e 2026, a BRF está desenvolvendo um projeto, ainda em estágio inicial, para aproveitar o alto volume de candidatos inscritos em diversas vagas, mas que não foram selecionados.
O modelo, que promete ser o primeiro do tipo no mercado, parte do princípio de que esses candidatos têm algo em comum: a afinidade com a marca empregadora e o desejo de trabalhar na BRF. Assim, a ideia é que a ferramenta analise os currículos, encontre talentos em potencial, alinhe seus perfis com vagas por abrir e, automaticamente, os convide para participar de novos processos seletivos.
Conteúdo inédito da Think Work Lab para o Acrescenta, do iFood Benefícios. Em breve, também disponível no Think Work Lab, na área exclusiva para assinantes