Inclusão no ambiente de trabalho: os danos do capacitismo
Como promover ações para uma cultura mais justa e inclusiva
27 de Maio de 2024
Leitura de 6 min
A luta por uma sociedade e um mercado de trabalho mais inclusivos vai além de apenas oferecer oportunidades para pessoas com deficiência. É necessário pensar em todas as particularidades e acessibilidades que envolvem ter um profissional PcD ou neurodivergente no time. Dessa forma, evitamos uma inclusão “rasa” e que, na prática, não combate o capacitismo, mas só reforça suas diferenças.
De acordo com dados do IBGE, com base na Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) de 2022, o Brasil possui 17,5 milhões de pessoas com deficiência em idade para trabalhar (14 anos ou mais), mas apenas 26,6% estão inseridas no mercado de trabalho. Ainda segundo a pesquisa, cerca de 55% das pessoas com deficiência que trabalham estão em empregos informais.
Índice:
- O que é o capacitismo?
- Capacitismo no ambiente de trabalho
- Como saber se a empresa está sendo capacitista?
- Expressões capacitistas para você eliminar do vocabulário
- 5 práticas para combater o capacitismo no ambiente de trabalho
O que é o capacitismo?
É uma forma de discriminação que se baseia no pressuposto de que as pessoas com deficiência física, intelectual ou mental são incapazes de realizar determinadas tarefas. Esse tipo de preconceito torna o olhar sobre estas pessoas enviesado, inferiorizado e, portanto, discriminatório.
Não contemplar pessoas com deficiência nos âmbitos da educação, emprego, saúde e acesso a serviços públicos são sintomas graves do capacitismo. Além disso, pode se manifestar em diferentes atitudes que, inclusive, aparentam ser positivas. A superproteção, a piedade e os elogios exagerados são práticas que podem conter este viés.
Capacitismo no ambiente de trabalho
Apesar de as empresas estarem cada vez mais engajadas em combater o preconceito e abordarem temas de diversidade e inclusão, ainda temos um longo caminho a percorrer. O capacitismo no ambiente de trabalho pode acontecer por meio de expressões, falas ou atitudes no dia a dia. Conhece as expressões “Dar mancada” ou “O time não possui braço para essa demanda”? Estes são apenas dois exemplos de capacitismo, entre vários que cometemos sem nem ao menos perceber.
Como saber se a empresa está sendo capacitista?
Algumas situações podem parecer bem comuns no dia a dia, mas precisam de atenção. Confira alguns exemplos onde o departamento de Recursos Humanos pode estar agindo de forma capacitista, mesmo que de forma inconsciente:
Se o recrutamento e seleção não é acessível
Exigir a participação em entrevistas presenciais e não oferecer alternativas remotas exclui candidatos com deficiência. É necessário que o RH garanta que todas as etapas do recrutamento sejam acessíveis aos candidatos.
Pessoas com deficiência auditiva podem precisar de um intérprete de Libras, por exemplo. Candidatos com baixa visão necessitam de adaptação na etapa de testes, se houver. Mais do que somente abrir vagas para preenchê-las com candidatos com algum tipo de deficiência, é necessário garantir um processo seletivo acessível a todos.
Se os espaços de trabalho não são acessíveis
Além de uma etapa de recrutamento e seleção acessível, é preciso que o local de trabalho também atenda às necessidades de acessibilidade dos colaboradores com deficiência. Não olhar para as necessidades individuais dos colaboradores ou não oferecer formas para que o trabalho seja realizado de forma confortável é uma ação capacitista.
Se a gestão desconsidera o crescimento e desenvolvimento profissional
Ignorar que as pessoas com deficiência devam ser promovidas ou presumir que elas não sejam capazes de realizar uma tarefa apenas devido a sua deficiência é uma atitude capacitista.
Se você faz uso do “heroísmo” ou “coitadismo”
Quantas vezes não ouvimos as pessoas falarem “Você é uma guerreira!” ou “Nem parece que você tem uma deficiência”? Essa supervalorização das realizações de tarefas básicas feitas por pessoas com deficiência é vista como “heroísmo”. O “coitadismo”, por outro lado, é quando as pessoas subestimam a capacidade de pessoas com deficiência pelo simples fato delas possuírem uma limitação. Tudo isso faz parte do capacitismo.
Se você infantiliza pessoas com deficiência
Pessoas com deficiência sentem quando são tratadas como crianças. Em alguns casos, ao invés de perguntarem algo diretamente a elas, as pessoas costumam falar com seus acompanhantes como se elas não soubessem ou pudessem responder. Algumas atitudes que parecem cuidado, na verdade, representam capacitismo.
Expressões capacitistas para você eliminar do vocabulário
Uma das características do capacitismo é fazer uso de falas ou expressões que coloquem as pessoas com deficiência em um papel de inferioridade. Algumas expressões já estão tão enraizadas em nosso vocabulário, que parecem frases comuns, mas, na verdade, são capacitistas, e muitas vezes nem sabemos disso. Ah, e nem é só pelo fato de usarmos com pessoas com deficiência, mas são expressões que não devem ser adotadas em nenhum tipo de contexto ou situação, mesmo na ausência de pessoas com deficiência. Entenda quais são essas expressões e como você pode substitui-las:
- “Dar mancada”
Ao invés de falar que uma pessoa “deu mancada”, diga que não cumpriu com o combinado ou não finalizou o que deveria.
- “Dar uma de João sem braço”
Substitua essa expressão por “Ele/ela deu uma de desentendido/desentendida”.
- “Fingir demência”
Quando pensar em usar essa expressão, substitua por “Ele/ela fingiu que não entendeu”.
- “Essa pessoa é braço curto”
Nesse caso, geralmente, queremos nos referir a pessoas que não querem colaborar com alguma atividade, portanto, você pode falar isto para não ser capacitista.
- “Nosso time não tem braço para isso”
Ao invés de utilizar essa expressão, fale que o time precisa de mais colaboradores para completar a tarefa. Fica bem melhor!
- “Você está cego?”
Não pergunte se uma pessoa está cega, pergunte se ela está prestando atenção.
- “Você é surdo?”
É preferível perguntar se a pessoa está entendendo o que você quis dizer, não é? A frase é ainda mais empática caso a pessoa não esteja entendendo e precise de uma nova explicação.
- “Tá parecendo autista!”
Essa expressão é muito utilizada para falar de uma pessoa que está isolada ou desatenta às situações. Portanto, você pode substituir justamente por essas palavras: “Você parece desatento(a) hoje” ou “Você parece isolado(a) hoje”.
- “Isso é coisa de retardado!”
Utilizada constantemente para criticar alguma atitude considerada errada, reforça um xingamento a pessoas com deficiência intelectual, portanto, elimine essa expressão do vocabulário. Para falar sobre algo que você considera errado, fale simplesmente que não acha correto ou de bom-tom.
5 práticas para combater o capacitismo no ambiente de trabalho
1. Estações de trabalho acessíveis
Esteja ciente das necessidades de cada colaborador e faça com que o ambiente esteja adaptado para os colaboradores realizarem o trabalho de forma confortável e eficaz. A acessibilidade também se faz necessária nas tecnologias e documentos utilizados pela empresa.
2. Conscientize os colaboradores
Ofereça programas de treinamento regulares para aumentar a conscientização sobre pessoas com deficiência e promova uma cultura de inclusão e respeito. O conhecimento e a educação são a principal ferramenta para contribuir com ambientes mais inclusivos e menos capacitistas.
3. Desenvolvimento e crescimento profissional
Avalie e garanta que todos os colaboradores tenham acesso a oportunidades de crescimento profissional, baseando as decisões em mérito e habilidades individuais.
4. Políticas e benefícios
Revise com frequência as políticas da empresa e garanta que elas estejam justas e inclusivas a todos os colaboradores.
As empresas também cometem capacitismo ao não cumprirem com a Lei n.º 13.146/2015 (Lei Brasileira de inclusão da Pessoa com Deficiência - LBI), que amplia o direito de inserção das pessoas com deficiência também no mercado de trabalho.
5. Inclua pessoas com deficiência nas decisões
Excluir pessoas com deficiência de algumas decisões sem motivo aparente é uma forma de capacitismo. Portanto, garanta que exista representação deste público na organização e que tenham voz ativa em decisões que podem afetar diretamente sua rotina.