Por que grandes líderes estão esgotados, mesmo dormindo bem ou tirando férias?

Entenda por que líderes vivem exaustos e como fechar ciclos pode restaurar sua energia, foco e clareza mental.

Foto de Ricardo Basaglia

Por Ricardo Basaglia

Ricardo Basaglia é mestre em Administração pela FGV e tem extensão em Behavioral Science of Management em Yale. Head da Michael Page desde 2007, é criador de conteúdo sobre carreira e liderança, e um dos headhunters mais acompanhados do Brasil.

12 de Novembro de 2025

Leitura de 5 min

Você já acordou depois de 8 horas de sono sentindo que não descansou nada?
Já chegou ao final da semana com aquela sensação de que a segunda-feira nunca realmente terminou?

Já sentiu aquele cansaço que férias não curam, que final de semana não resolve, que nem mesmo uma promoção consegue aliviar?

Se você sabe do que estou falando, preciso te contar algo: seu problema não é excesso de trabalho, nem falta de descanso.

É algo muito mais sutil e devastador: você está vivendo com dezenas de conversas mentais que nunca terminam, decisões pela metade e promessas não cumpridas que seu cérebro carrega como abas abertas num navegador que nunca desliga.

É por isso que você lembra de responder aquele e-mail às 2h da manhã, mas esquece o que comeu no almoço.
O cérebro não guarda o que termina. Ele rumina o que ficou aberto.

Índice:

O ritmo natural do cérebro humano

O cérebro humano evoluiu durante milhares de anos com este ritmo: começar algo, desenvolvê-lo e concluí-lo.
Era assim que nossos ancestrais caçavam, construíam abrigos, criavam ferramentas. E era assim que nossos avós trabalhavam.

O sapateiro terminava o sapato.
O agricultor colhia o que plantou.
O comerciante fechava a loja e ia para casa.

Havia uma sensação tangível de conclusão no final de cada dia.
Cada ciclo fechado liberava dopamina, confirmava competência, trazia paz.
A mente descansava porque o trabalho estava, literalmente, completo.

A era do “draft permanente”

Mas então chegamos ao século XXI e quebramos esse contrato milenar com nossa própria mente.
Hoje vivemos na era do draft permanente, do "depois a gente conversa melhor", do e-mail marcado como não lido para responder mais tarde, da reunião que termina com "vamos marcar outra para definir".

Transformamos a vida numa sequência interminável de reticências, onde nada realmente acaba.
E nosso cérebro, que foi programado para buscar fechamento, entrou em colapso silencioso.

Agora carregamos não apenas nossas tarefas, mas o peso psicológico de tudo que ficou em aberto.
Nem sempre é burnout: muitas vezes é excesso de abas mentais.
O nome moderno do cansaço é pendência.

O que a neurociência diz sobre isso

A neurociência tem um nome para isso: Efeito Zeigarnik, descoberto pela psicóloga russa Bluma Zeigarnik em 1927.
Ela observou que garçons lembravam perfeitamente de pedidos não pagos, mas esqueciam completamente assim que a conta era fechada.

Desde então, outros estudos mostraram que tarefas inacabadas permanecem ativas na mente, gerando ruminação e sobrecarga cognitiva.

Em paralelo, relatórios recentes da Microsoft indicam que profissionais do conhecimento vivem sob constante “dívida digital” – um ciclo de interrupções e notificações que mina o foco e aumenta a exaustão mental.

A mente não diferencia entre uma decisão significativa ou banal, que envolve muito dinheiro ou nem tanto assim: ela só sabe que algo está pendente.

6 estratégias para fechar ciclos e recuperar energia mental

  1. Faça o inventário do inacabado
    • Reserve uma hora este final de semana e liste tudo que está pendente, desde a conversa difícil com seu sócio até o presente de aniversário atrasado.
    • Não julgue, apenas documente.
    • Você ficará surpreso ao descobrir quantas pendências pequenas estão drenando sua energia.
    • O simples ato de tornar visível o invisível já reduz significativamente a ansiedade.
    • Muitos executivos descobrem que carregam 30, 40 pendências mentais que poderiam ser resolvidas em uma tarde.
       
  2. Pratique o encerramento diário
    • Antes de dormir, escreva três coisas que você concluiu no dia, mesmo que pequenas.
    • Responder aquele WhatsApp difícil conta. Tomar aquela decisão adiada conta. Finalizar aquela apresentação conta.
    • Isso reprograma seu cérebro para buscar conclusões, não apenas inícios.
    • É um ritual simples que recondiciona sua mente a valorizar o que foi fechado, não apenas o que foi começado.
       
  3. Institua a regra das 48 horas
    • Se algo está na sua mente há mais de dois dias, faça alguma coisa a respeito – nem que seja decidir conscientemente não fazer nada.
    • A indecisão prolongada é mais exaustiva que qualquer decisão errada.
    • Responda o e-mail, mesmo que seja para dizer não.
    • Cancele a reunião que você sabe que não vai acontecer.
    • Desista oficialmente daquele projeto paralelo.
    • Cada decisão tomada é uma aba mental fechada.
       
  4. Crie rituais de transição
    • Desenvolva marcos claros entre trabalho e vida pessoal.
    • Pode ser tão simples quanto desligar notificações às 19h ou fazer uma caminhada de 10 minutos após o expediente.
    • Feche fisicamente o notebook.
    • Guarde os papéis na gaveta.
    • Desligue o computador completamente, não apenas o monitor.
    • Seu cérebro precisa de sinais físicos de que um período acabou e outro começou.
    • Sem esses rituais, você carrega o escritório na mente 24 horas por dia.
       
  5. Execute o fechamento mínimo viável
    • Nem toda pendência precisa de uma solução elaborada.
    • Às vezes, mandar um áudio de 30 segundos resolve o que um e-mail de três parágrafos complicaria.
    • Dizer "mudei de ideia sobre isso" é melhor que deixar alguém esperando.
    • Admitir "não vou conseguir entregar" libera mais energia do que carregar a culpa silenciosa.
    • Deletar aquele rascunho que está há meses na pasta é um ato de libertação.
    • Pequenos fechamentos diários evitam o acúmulo de grandes pendências.
       
  6. Aceite que fechar dói
    • Alguns ciclos são difíceis de encerrar – o fim de uma sociedade que não deu certo, a desistência de um projeto ambicioso, o reconhecimento de que aquela oportunidade passou.
    • Mas manter esses ciclos artificialmente abertos dói mais.
    • É como manter um relacionamento terminado no WhatsApp só para não ter que arquivar a conversa.
    • Fechar um ciclo importante pode doer por uma semana.
    • Mantê-lo aberto vai doer por anos.
    • Escolha a dor que tem fim.

O verdadeiro descanso vem do fechamento

No fundo, o que descobrimos é que a exaustão moderna nem sempre vem do excesso de ação, mas do excesso de suspensão.
Não é necessariamente o volume de trabalho que nos esgota – é carregar mentalmente o que não foi resolvido.

Seu cérebro não está cansado de processar informação; está cansado de não conseguir arquivar nada.
É como deixar todos os aplicativos do celular abertos ao mesmo tempo – não é o uso que drena a bateria, é manter tudo em standby.

A diferença é que não existe botão de reiniciar para a mente humana, apenas a disciplina diária de concluir o que foi começado.

 

Quer liderar com mais leveza e foco? Comece fechando seus próprios ciclos. A verdadeira liderança começa dentro da mente.

Gente e gestão

Compartilhe esse post

Copiar Link
Compartilhar no Whatsapp
Compartilhar no LinkedIn
Compartilhar no Twitter
Compartilhar no Facebook

0

Últimas publicações

Mais sobre: Gente e gestão